Ética & Integridade: A Lei Anticorrupção e os impactos na sua empresa

por Tatiana Regiani


Nos últimos anos, o Brasil tem dado mais atenção à questão da corrupção, regulando com maior rigor atos ilícitos de pessoas físicas e jurídicas. Em agosto de 2013, impulsionada pelos escândalos decorrentes de fraudes e corrupção empresarial, incluindo os diversos desdobramentos da Lava Jato até hoje, e embalada por grandes manifestações populares no Brasil, foi aprovada a Lei nº 12.846/2013.

Mais conhecida como Lei Anticorrupção, esse foi um importante avanço em direção ao combate a crimes contra a administração pública e outros atos ilícitos que podem impactar empresas de qualquer porte ou tipo, pois passou a prever severas punições àquelas envolvidas em práticas relacionadas à corrupção.

Contudo, o principal objetivo dessa lei não é apenas punir com mais rigor, mas também prevenir e corrigir, criando uma cultura de ética que deve ser cultivada por todos os membros da empresa, desde seus sócios ou acionistas até funcionários, parceiros e fornecedores.

Para as empresas, o custo e as consequências da corrupção são muito altos, e podem acarretar diversos impactos negativos: despesas com apuração ou punição, perda de confiança, reputação negativa, perda de clientes e parceiros, inabilitação para participar de licitações ou contratos com entes públicos, entre outros prejuízos. Tudo isso também se torna insustentável do ponto de vista financeiro, e a competitividade, vital para a empresa, é ameaçada.

Por outro lado, a LAC pode ser uma grande oportunidade para as pequenas e médias empresas que agem com prevenção. Para você ter uma dimensão da abrangência dessa lei, vamos explicá-la detalhadamente e apontar o que deve ser feito para proteger sua empresa.

O que é a Lei Anticorrupção (LAC)?

A LAC trouxe avanços ao tema no Brasil, sendo a principal novidade a responsabilização objetiva, civil e administrativa, da empresa que praticar o ato lesivo, seja por meio de funcionários, seja por terceiros. Dessa forma, não é necessário comprovar se houve intenção dos dirigentes ou dos donos das empresas em lesar a administração pública, nem se o benefício gerado pelo ato ilícito chegou a ser auferido concretamente.

Com esse entendimento acerca da responsabilização, o Decreto nº 8.420/2015 tornou indispensável às empresas adotarem normas e práticas para prevenção, identificação e punição de condutas ilícitas. E o principal meio para se estar em conformidade com essa regulamentação é implementar um Programa de Integridade.

A LAC abrange todas as esferas da administração pública federal, estadual e municipal. Nesse sentido, o Rio Grande do Sul e diversos municípios deste Estado já a regulamentaram, incluindo questões relacionadas à competência para instaurar e julgar o processo administrativo de responsabilização, o chamado PAR, com a finalidade de apurar a responsabilidade de pessoa jurídica, bem como à atribuição e critérios para avaliar programas de integridade (conjunto de medidas de integridade – valores, regras, procedimentos – adotado por uma empresa com o objetivo de evitar, detectar e interromper a ocorrência de irregularidades, fraudes e corrupção. (CGU, Integridade para pequenos negócios, 2017)

A quem atinge?

Todo e qualquer tipo de empresa, instituição, fundação, associação ou cooperativa, com ou sem fins lucrativos, micro, pequena, de médio ou grande porte, qualquer que seja o setor ou área de atuação, pode responder em casos de constatação de atitudes ilícitas ou corruptas, mesmo as que não estiverem diretamente envolvidas ou seus administradores ou responsáveis não tiverem sido envolvidos.

A LAC abrange todos os níveis de atuação, e a pessoa jurídica poderá ser penalizada pelos atos cometidos por funcionários de qualquer nível ou até por seus terceirizados ou parceiros, lembrando que a responsabilização das empresas não impede a responsabilização da pessoa física envolvida no ato de fraude ou corrupção. Portanto, todos devem se responsabilizar pelo que acontece nas instituições, já que a empresa em questão responderá pelo ato lesivo, independentemente de culpa, dolo ou comprovação de intenção da prática do ilícito.

Com essa visão mais holística, é possível ver que os custos e as consequências da corrupção passaram a impactar todos — empresas, governo e sociedade civil —, e isso pode constituir um obstáculo para o desenvolvimento social e econômico do país.

Quais são as penalidades?

Depende da gravidade e do tipo de crime cometido. Na esfera judicial, pode haver a perda de bens, direitos ou valores que representem a vantagem ou o proveito, direta ou indiretamente obtidos da infração, suspensão ou interdição parcial das atividades e até a dissolução compulsória da pessoa jurídica. Na esfera administrativa, pode ter aplicação de multa de até 20% do faturamento bruto do último exercício, publicação extraordinária da decisão condenatória e inclusão do nome da empresa no Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (CEIS) e Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP).

Como você e sua empresa podem se preparar?

É fundamental garantir a integridade na sua empresa. Para tanto, faz-se necessária a implementação de um Programa de Integridade. Mas de que forma isso é feito? Estabelecendo valores, regras, mecanismos e procedimentos para orientar a atuação de seus funcionários e dirigentes, tanto internamente quanto na relação com clientes e parceiros, com o objetivo de prevenir, detectar e sanar a ocorrência de desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos.

O Programa de Integridade será tão ou menos robusto conforme as especificidades da sua empresa, sendo que, para qualquer caso, o primeiro passo será sempre realizar uma análise e avaliação de riscos para o cometimento de atitudes antiéticas e ilegais. Trata-se de implementar, de fato, além de uma cultura de ética, uma gestão de riscos e controles internos de forma eficaz. Embora a legislação não dê uma fórmula, é necessário que o programa seja elaborado sob medida para cada empresa, levando em consideração suas particularidades e a realidade do negócio.

A intenção da LAC é, sobretudo, prevenir a corrupção, criando um ambiente de integridade nas instituições brasileiras. Daí a importância de as empresas cumprirem todas as normas, pois ainda que sejam constatados atos ilícitos, o fato de sua empresa ter um Programa de Integridade eficaz será considerado um atenuante no cálculo da sanção administrativa de multa.

A instalação e o funcionamento de um programa desse tipo na sua empresa demonstram que você tem preocupação e comprometimento com os padrões éticos, a responsabilidade, a transparência, a sustentabilidade e a eficiência de sua gestão. O inverso é verdadeiro, uma vez que a ausência do programa pode demonstrar falta de interesse em evitar atos de corrupção, constituindo um agravante.

Uma das razões para as empresas adotarem medidas de integridade em seus negócios é o receio de serem responsabilizadas em caso de cometimento de atos lesivos. Esse temor faz com que grandes empresas se preocupem cada vez mais com as empresas locais com as quais fazem negócios e prefiram parceiros que adotem medidas de integridade. Assim, uma empresa correta e que possua medidas de integridade terá mais chances de ser escolhida. Isso se chama “diferencial competitivo”.

Com a sociedade clamando por mais ética, mais integridade e menos corrupção, visto nas últimas eleições, e considerando o novo governo que propôs medidas mais acirradas com o “Pacote Anticrime”, a tendência é que a questão da corrupção seja cada vez mais demandada pela sociedade e tratada de forma ainda mais rigorosa.
Portanto, sua empresa deve planejar ações para consolidar uma cultura de ética e integridade, pois não é mais uma opção não possuir mecanismos anticorrupção. Adeque o quanto antes os processos à regulação e implemente um Programa de Integridade. Às empresas que já possuem tal programa, revejam se os mecanismos preventivos estão sendo efetivos e busquem apoio externo para analisar seus programas. Somente assumindo a responsabilidade enquanto sociedade é que será possível criar uma cultura de ética em nível individual, organizacional e nacional, resultando em mais transparência e competitividade às empresas.

PARA SABER MAIS
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. (“Lei Anticorrupção”). Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências. Brasília, 1 ago. 2013. 

BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015. Regulamenta a Lei no 12.846, de 1º de agosto de 2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira e dá outras providências. Brasília, 18 mar. 2015. 

CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO. Portaria nº 909, de 7 de abril de 2015. Dispõe sobre a avaliação de programas de integridade de pessoas jurídicas. 2015. 

CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO. Portaria nº 910, de 7 de abril de 2015. Dispõe sobre os procedimentos para apuração da responsabilidade administrativa e para celebração do acordo de leniência de que trata a Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. 2015. 

CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO. Programa de integridade: diretrizes para empresas privadas. 2015.

CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO. Integridade para pequenos negócios. 2017. 

INSTITUTO BRASILEIRO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA. Compliance à luz da governança corporativa. São Paulo: IBGC, 2017. 

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Operação Lava Jato.

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