Gestão do Negócio: Planejamento sucessório fortalece a competitividade das empresas

Transformar, melhorar, evoluir a estrutura da governança para ser uma empresa organizada enquanto família e negócio, são desafios das famílias empresárias. E sempre é importante manter o diálogo e a comunicação sobre questões que envolvem o futuro da empresa. Muitas vezes, o fundador toma decisões que nem sempre estão alinhadas às expectativas dos herdeiros. Em outros casos, os sucessores têm liberdade para contribuir com ideias que reforcem a presença de uma marca no mercado, tornando a empresa mais competitiva. Nesta reportagem, destacamos a gestão de negócios da Casa Perini, onde o fundador permanece no comando, mas os filhos participam das decisões estratégicas, inovando e impulsionando a atividade vitivinícola que está na raiz da família.

Gabriela Marcon
gabi.marcon@idefamiliar.com.br


A família Perini começa a contar a sua história no setor vitivinícola a partir de 1929, quando o filho de imigrantes italianos João Perini elaborou os primeiros vinhos de forma artesanal, no porão de sua casa no Vale Trentino, região que fica na divisa dos municípios de Caxias do Sul e Farroupilha, na Serra Gaúcha. João era pai de Benildo, que 40 anos mais tarde daria início à trajetória da Casa Perini. Após o falecimento do pai, em 1968, e motivado pelo tio a abrir seu próprio negócio, Benildo Perini não pensou duas vezes. “Meu tio já tinha a Vinícola Perini em Gramado, e na missa de primeiro ano de morte do meu pai ele me disse que eu tinha de sair da cooperativa porque meu pai havia me deixado uma produção de vinho e um bom nome. E foi o que fiz. Saí e registrei a vinícola”, conta o fundador.

Nascia assim, em 1970, no distrito de Santos Anjos, em Farroupilha, a Casa Perini, trabalhando na produção do primeiro rótulo de vinho que foi batizado com o nome do patriarca da família: Jota Pe vem da pronúncia das letras J e P, de João Perini. A marca, que também tem sucos de uva integrais, se mantém há oito anos no Top of Mind da Revista Amanhã como o vinho mais lembrado pelos gaúchos.

Dentre os primeiros desafios do negócio, o empresário destaca uma ida a Porto Alegre, em 1971, com exatos 110 volumes (garrafões) de vinho da Jota Pe para vender. “Estava feliz da vida porque levava meu próprio vinho, mas não esqueço que vendi apenas 30 volumes e voltei com 80. Me emociono só de lembrar, também porque tive uma grande mãe que dizia que os gaúchos iriam beber meu vinho. Consegui dar a volta por cima, contando muito com a ajuda da Maria do Carmo, que casou comigo em 1979 e já trabalhava ao meu lado naquela época, quando éramos namorados”, recorda o diretor-presidente que transformou um pequeno negócio familiar numa das vinícolas mais premiadas do Brasil.

O trabalho, a persistência e paixão pela atividade vitivinícola acompanham três gerações da família Perini. Transformar uva em vinho sempre fez parte da vida deles, assim como a ousadia em empreender. Tanto é assim que a Casa Perini foi a primeira vinícola de capital nacional a produzir espumantes, a partir de 1998. “O que fez com que meu pai resolvesse abrir uma vinícola que nunca parou de crescer também foi a ambição e a vontade de inovar, que nos torna inquietos. Então sempre queremos fazer mais e melhor. Se não deu de um jeito, vai de outro. Nós insistimos”, diz Franco Perini, 39 anos, diretor comercial.

Desde cedo, Franco se envolveu com o trabalho da família. Como ele mesmo diz, “se criou dentro da vinícola”, onde muitas das suas horas vagas no turno contrário ao da escola eram dedicadas ao negócio. Ainda na pré-adolescência, ele ajudava nas mais diversas tarefas, desde descarregar caminhões de açúcar até lavar pipas de vinho. “Com o passar do tempo, fui desenvolvendo outras capacidades, entrei para a faculdade de Administração, fui me aperfeiçoando, sempre com a preocupação em fazer a empresa crescer”, afirma.

Já a graduação em Publicidade e Propaganda deu ao irmão mais novo, Pablo, 35 anos, qualificação e experiência na área de divulgação. Mas, antes de assumir a direção do marketing da vinícola, ele trabalhou em agências de propaganda realizando tarefas e assumindo funções ligadas à área de design e gestão de marcas. Além disso, para entender mais sobre o negócio da família e representar melhor as marcas da vinícola nos eventos do setor, Pablo ampliou seu conhecimento ao se formar como sommelier internacional de vinho.

SUCESSORES CONTRIBUEM NA INOVAÇÃO DO NEGÓCIO

Com quase 50 anos de história, a Casa Perini segue sob o comando de seu fundador, mas os sucessores são diretores de dois setores importantes: o Comercial e o Marketing. Apesar das funções específicas, eles foram criando competências naquilo que o negócio precisa para se destacar e se diferenciar, transitando por vários setores da vinícola, interagindo com os funcionários e com o corpo técnico responsável pela elaboração dos vinhos e participando da evolução qualitativa dos produtos.

Além da primogênita Jota Pe e da linha de vinhos finos e espumantes que leva o nome da vinícola, a Casa Perini tem outras três marcas: Arbo, Macaw e, mais recentemente, Noblesse. Em termos de notoriedade em vinhos finos, o produto principal é o espumante. Com a presença em guias, exposições e a participação em provas e concursos nacionais e internacionais, a vinícola acumula mais de 200 premiações em diversas categorias de vinhos e espumantes, incluindo a distinção, em 2017, de 5º Melhor Vinho do Mundo para o Espumante Moscatel Casa Perini, concedida pela WAWWJ (World Association of Writes & Journalists of Wines & Spirits), a Associação Mundial de Jornalistas e Escritores de Vinhos e Espirituosos.

Todas essas distinções têm relação com o fato de Benildo Perini ter confiado na capacidade da geração seguinte, delegando funções aos filhos e permitindo que eles implementassem inovações que ajudaram a impulsionar a empresa. “Os filhos vão para o mercado e trazem novidades. No complemento do trabalho da geração mais jovem reside a riqueza da longevidade do negócio”, afirma.

Na visão de Franco, na medida em que os sucessores começam a apresentar um número maior de acertos do que de erros nos negócios, eles adquirem mais permissão dos fundadores para colocar suas ideias em prática, ainda que haja resistência no início. No case da Perini, uma prova disso é a marca de cerveja Matarelo – nome que é uma homenagem à pequena cidade da região do Trento, na Itália, de onde partiram os imigrantes que se estabeleceram na Serra Gaúcha a partir de 1875.

Elaborar receitas exclusivas de cerveja era um sonho dos filhos de Seu Benildo. “Mantemos o hábito de jantar em diversos ambientes gastronômicos. E quando a gente vai nesses lugares sempre encontramos cervejas especiais. Foi a partir disso que liberei o negócio da cerveja e também porque o Franco acabou transformando em marca a cidade dos nossos antepassados”, ressalta o fundador.

Já com o aval do pai, em 2015 foi firmada parceria com um produtor de cerveja para elaboração das receitas. “A gente vive o mercado e temos foco na inovação. Precisávamos ser a primeira vinícola a ter uma marca de cerveja. Hoje temos a marca, a receita e a distribuição da Matarelo”, revela Franco. Pablo acrescenta que foi assertivo o fato de criar e registrar a marca da cerveja com um nome vinculado às origens da família, mas sem misturá-la à história da marca Casa Perini. “A construção das marcas na categoria de vinhos e espumantes já é bastante reconhecida e isso precisava ficar claro para o consumidor e para o mercado”.

O crescimento da empresa, segundo Pablo, passa pela questão de muito alinhamento interno em relação aos investimentos em ações de marketing, sendo o enoturismo o principal medidor de sucesso. Ele e o irmão incluíram atividades de lazer para melhorar a experiência dos turistas no consumo de vinho, como a Vino Run – corrida que acontece no inverno e termina com degustação de vinhos, o Bike Tour – passeio de bicicleta em meio aos vinhedos, e a Wine Experience – experiência sensorial na qual os visitantes, com os olhos vendados, têm de identificar ingredientes naturais que contêm aromas utilizados no vinho, aproximando-os do universo da bebida de maneira descontraída.

Em 2016, a Casa Perini fechou o ano com quatro mil visitantes. Em 2019, a expectativa é receber mais de 30 mil pessoas. Além de todas as ações relacionadas ao enoturismo, os filhos associam o expressivo aumento do número de turistas à participação da vinícola no programa MasterChef, exibido no Brasil pela Band. Para Seu Benildo, que no início resistiu à ideia de investir no programa, a inserção dos produtos da Casa Perini no maior reality show de culinária do mundo foi uma das iniciativas mais inteligentes que os filhos tiveram para projetar a marca. A primeira participação no programa foi em 2017 junto com outras vinícolas da região. Depois, a Casa Perini recebeu toda a produção, os apresentadores e participantes de uma das edições para gravar uma prova em equipe, onde a família participou como jurada dos pratos elaborados pelos competidores em harmonização com os vinhos da empresa.
Esbanjando vitalidade, Benildo Perini diz que fez “uma solicitação a Deus” para que Ele lhe conservasse. “E tenho me empenhado para isso (risos), mas é hora de formalizar a sucessão. Acompanho o setor de longa data e a gente vê colegas nossos partindo e ficando muitos desentendimentos entre os familiares. Têm casos graves de empresas que estavam bem e estão passando por momentos delicados. E a Casa Perini é uma empresa que sempre acreditou que amanhã será um dia melhor”, reflete.

Assim como o ciclo da videira, a sucessão na Casa Perini está seguindo o processo natural: foi brotada, cresceu, floresceu e está na fase de amadurecimento. O fundador e diretor-presidente plantou a semente e os sucessores estão tendo o cuidado de fazê-la crescer saudável, para colher as uvas mais frescas, produzir vinhos saborosos e perpetuar todo esse legado. “Sabemos da importância da nossa missão e, inevitavelmente, a partir do momento em que sei que vou ter filhos, a gente começa a pensar em sucessão, a projetar o futuro em cima das pessoas que estão vindo”, avalia Franco. “Fui trabalhando, adquirindo o respaldo e a confiança do meu pai e tendo a permissão de fazer parte de decisões mais estratégicas. Temos consciência de que existe uma sucessão que vai acontecer, ainda que a empresa esteja bem enraizada na figura do Seu Benildo”, considera Pablo.

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