Empresa familiar: o universo não-racional das dinâmicas familiares

Muitos são os fatores que contribuem para a extinção de uma empresa ou para a sua incapacidade de manter-se independente. Entre esses fatores estão a maturação dos negócios, as transformações de mercados e tecnologias e a rápida mudança de estratégias de sucesso por parte dos concorrentes. Sabe-se, no entanto, que as empresas familiares têm vantagens específicas como a agilidade na tomada de decisão, a lealdade existente entre familiares, o relacionamento mais duradouro, a liderança mais estável e o pensamento de longo prazo.

Mas, segundo Kets de Vries, Carlock e Florent-Treacy, autores do livro A Empresa Familiar no Divã, é a própria família quem geralmente representa a maior ameaça a continuidade dos negócios. Isso porque de um lado estão os problemas organizacionais com que se deparam todas as empresas no seu dia-a-dia e, de outro, os complexos problemas emocionais e de relacionamento próprios da convivência familiar.

Conflitos pessoais não resolvidos, falta de confiança, relações interpessoais complicadas, rivalidade entre irmãos, problemas entre as diferentes gerações e pretensões da família sobre a empresa; todos esses são fatores que podem afetar o sucesso do empreendimento familiar. É necessário reconhecer que nas empresas familiares o pensamento estratégico e as práticas empresariais são seguidamente afetadas pelas necessidades afetivas da família – e é neste universo não-racional que a empresa familiar precisa ser analisada.

Segundo os autores, investigações clínicas revelaram que muitos dos problemas presentes nos empreendimentos familiares resultam do fato de que seus líderes costumam involuntariamente extravasar seus mais profundos conflitos, desejos e reações de defesa no dia-dia da empresa familiar.

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Livro aborda a empresa familiar sob uma perspectiva psicológica

Muitas empresas familiares enfrentam um conflito entre amor (família) e trabalho (empresa) pelo fato de essas esferas não estarem adequadamente separadas uma da outra. Muitas vezes, aliás, a empresa se torna uma extensão da família e assume as suas regras e padrões comportamentais. Se o padrão de funcionamento de uma família incitar a fixação de limites claros e a tomada efetiva de decisões, por exemplo, ele promoverá processos empresariais sólidos e sensatos. Da mesma forma, se tais limites não forem nítidos e o funcionamento da família for ineficaz ou conflitante, os processos gerenciais serão afetados negativamente.

Para os autores, é certo que as famílias que detém ou controlam empresas familiares poderão agir com mais prudência e eficácia se compreenderem as questões humanas centrais que geram os desafios familiares e organizacionais. Para tanto eles dedicaram uma parte do seu livro para analisar os desafios do amor e do trabalho nas empresas familiares e apresentam algumas áreas cruciais que estão expostas constantemente a conflitos – e que precisam estar em equilíbrio:

CAPITAL: de que modo os recursos financeiros da empresa são alocados entre as diferentes exigências da empresa e da família?

CONTROLE: quem na família e na empresa tem o poder de tomar as decisões? É o conselho de administração o verdadeiro decisor ou são o pai e a mãe que tomam as decisões na mesa de jantar?

CARREIRAS: de que modo os indivíduos são selecionados para assumir posições de liderança e governança na empresa ou na família? Ser um familiar é uma qualidade uma condição a ser considerada ou uma desqualificação? Podem ser incluídos os parentes por afinidade?

CONFLITOS: pode a família impedir que relações humanas conflituosas repercutam na empresa?

CULTURA: que valores são primordiais para os sistemas familiar e empresarial e de que modo são transmitidos? O desempenho nos negócios influencia o poder dos membros da família?

Infelizmente, ao analisar organizações, principalmente de origem familiar, muitos profissionais concentram-se em estruturas e sistemas em vez de atentar para as questões humanas e muitas vezes não-racionais da dinâmica familiar, incorrendo em sérios riscos de desregular ainda mais o sistema familiar durante um processo de sucessão.

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