Empresas familiares dependem de boas práticas de governança

Sabe-se que a cada 100 organizações familiares brasileiras, 30 passam para a segunda geração. Dessas, apenas 15 alcançam a terceira descendência, enquanto somente quatro sobrevivem à quarta geração. Outro dado que chama a atenção é que entre as grandes instituições, o número das que fecham as portas a partir do momento em que os filhos ou netos assumem o controle é alto. As informações revelam uma causa primordial: a carência de uma estrutura mínima de governança que possa prover um planejamento sucessório e a preparação de sucessores e sucedidos. Ainda mais em Caxias do Sul e região, onde cerca de 95% das empresas familiares são de perfil familiar, segundo dados do Instituto de Desenvolvimento da Empresa Familiar (IDEF), com sede em Caxias.

Clique na imagem para conferir a edição do informativo Metadados em que foi publicada a entrevista com Hana Witt

“Boas práticas de governança são fundamentais para que as empresas familiares contrariem as estatísticas e se mantenham ativas geração após geração”, alerta a professora e pesquisadora Hana Witt, fundadora do IDEF e especialista em Governança Familiar e Compliance. Entre o final de 2016 e o primeiro semestre de 2017, o IDEF realizou uma pesquisa com 103 fundadores, presidentes e diretores de empresas familiares de Caxias do Sul, Bento Gonçalves e Flores da Cunha. Na entrevista a seguir, Hana comenta com mais detalhes os resultados da pesquisa intitulada Retrato das Empresas Familiares da Serra Gaúcha.

Atualmente, é possível ter uma dimensão do número de empresas de perfil familiar em Caxias do Sul e região? É um número considerável?
Temos informações de que a grande maioria das empress da Serra Gaúcha é de perfil familiar, em torno de 95%. Portanto, somos uma região economicamente sustentada por empress familiares. É importante ressaltar que, segundo a pesquisa que realizamos, 52% das empresas familiares que entrevistamos estão sendo comandadas pelos seus fundadores, e 48% já possuem a segunda geração compartilhando a gestão do negócio, algumas destas já com o sucessor no comando.

É possível identificar em quais segmentos há mais empresas de perfil familiar na região da Serra?
O que podemos afirmar é que, independente do segmento, empresas de médio e pequeno porte da nossa região são essencialmente familiares. Alguns dados setoriais apontam que no segmento têxtil e de comércio há um número expressivo de empresas onde os funcionários são 100% familiares. Na pesquisa que realizamos, onde 68% eram do segmento metalmecânico, 75% delas disseram que além dos filhos, empregavam outros familiares, o que demonstra uma dependência muito grande da família aos resultados do negócio.

Pela sua experiência, o que é imprescindível para realizar uma sucessão tranqüila?
Para que a sucessão de uma empresa familiar transcorra bem é importante realizar um bom planejamento sucessório, que leve em consideração as necessidades e expectativas dos envolvidos, ou seja, sucessor e sucedido. Isso exige tempo, pois o processo de transição geracional requer mudanças de papeis e responsabilidades, mudanças na estrutura organizacional e muita preparação dos envolvidos.

Quais os problemas e contratempos mais comuns nesse processo?
Na pesquisa que realizamos em 2017, os maiores problemas estão relacionados à falta de comunicação, alinhamento familiar e visão de futuro compartilhada. Centralização do poder, falta de interesse ou despreparo dos sucessores também são motivos geradores de conflitos no processo sucessório.

De que forma esses contratempos podem ser resolvidos ou amenizados?
A família precisa incluir o assunto “sucessão” no planejamento do negócio e tratá-lo de forma específica. É preciso haver um diálogo sobre o futuro do negócio com todos os envolvidos, mesmo aqueles que não estão na gestão, mas são herdeiros e acionistas. É necessário que haja um plano de desenvolvimento tanto do sucedido como dos sucessores e isso exige tempo, pois envolve questões técnicas e também preparo emocional. É necessário ouvir as expectativas de todos e construir juntos um acordo familiar que leve em conta essas expectativas. Fazer uma sucessão planejada é o melhor caminho para diminuir impactos negativos nos negócios.

De que forma um profissional de Recursos Humanos pode contribuir para uma melhor transição geracional? Geralmente há envolvimento desses profissionais nesse processo? Como?
O profissional de Recursos Humanos é importantíssimo nesse processo, mas infelizmente é mais comum observarmos o RH com atuação focada no negócio, sem envolvimento no âmbito familiar. Já ouvi relatos de empresas que percebem que se dedicam mais no desenvolvimento dos funcionários do que sucessores! Muitas empresas consideram que os filhos já “nascem” prontos para o cargo. O profissional de RH pode contribuir muito na criação dos planos de desenvolvimento dos sucessores e sucedidos, acompanhando os envolvidos em processos de coaching ou mentoring, incluindo-os nos programas de desenvolvimento já existentes da organização.

Em seus cursos e palestras, quais principais “dores” dos empresários diante do processo de sucessão? E qual a sua orientação básica a eles?
Percebemos que os herdeiros apontam como maior preocupação a perda do fundador e a falta de informações do negócio devido à centralização do poder. Já os pais se preocupam com a escolha do sucessor, perguntam-se qual o filho mais preparado, ou se devem buscar profissionais externos. Outras questões levantadas são referentes ao futuro da empresa, se devem crescer, ampliar ou vender o negócio.

E quanto à gestão do patrimônio, da riqueza familiar?
Esse é um tema muito importante para as famílias empresárias. O patrimônio familiar não se perpetua por si, é construído ao longo do tempo e precisa ser gerido. Isso exige disciplina financeira. O desafio de preservá-lo é considerado, muitas vezes, maior do que construí-lo! Sabemos que a família cresce de forma exponencial, já o negócio não. Portanto, nem sempre acompanha o padrão de consumo que a família deseja. Se não houver atenção a esse tema, há riscos de lapidação de patrimônio e, consequentemente, impactos financeiros nos negócios.

Entrevista concedida ao jornalista Fabiano Finco para o informativo da Metadados. Leia aqui a edição completa.

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